sexta-feira, 2 de outubro de 2009

A Volta de Don Peixito.

Qual não foi minha surpresa ao deparar, novamente, com sua face sorridente encimada pelo chapéu de mestre-cuca, a barriguinha tão rotunda quanto era há mais de cinqüenta anos.
Era ele, não cabiam dúvidas.

Don Peixito, o astro das Sardinhas Ruby. Ele mesmo, embora estivesse fora de seu contexto habitual, que só poderia ser uma lata de sardinhas dos anos 40. 
Olhava-me agora de uma revista, na seção de restaurantes. E como sardinha, era de um estabelecimento de frutos do mar, que se havia apropriado de sua esquecida imagem.

Lembrei-me de um tempo de dinheiro curto, de notícias de uma guerra mundial pipocando no rádio, quando as latas de sardinha, que era nutritiva e barata, faziam parte obrigatória das compras de mercado. 

Eu babava por um bom sanduiche de sardinha com môlho de tomate, ou na salada... E um belo cuscuz, com sardinha, ovo e azeitona, então?
A Ruby deve ter sido a primeira que provei. Mais tarde, acho, veio a Coqueiro, que existe até hoje. As sardinhas em lata foram-se sofisticando, pois naquela época vinham com espinhas e - argh! - tripas, tendo que ser limpas para o consumo.

Então surgiram a Alcyon, a Gomes da Costa e outras, com refinados filés e molhos diversos. E meu gosto por sardinha em conserva foi declinando, o mesmo acontecendo com as na brasa, esse legado de nossos antepassados lusitanos.
Mas houve época, nos meus anos de Martinelli, que íamos a um bar de sardinhas, em pleno Largo São Francisco. Ali só se serviam as brasadas, sempre acompanhadas de muita cerveja, para lavar-lhes o marcante travo marinho.

Novidades foram ganhando terreno, e a preferência: o atum; a forma italianada da anchova, o devastador alicci.
Como disse, meu gosto pela sardinha foi minguando. Depois então que, em Madri, provamos tapas de grandes e saborosas anchovas, acompanhadas de pan cruyente, fica mesmo difícil retornar ao sanduíche de sardinha da infância.

Pobre Don Peixito! Eu nem lembrava mais dele, e acho que ele mesmo não sabe que teve tal nome um dia, e que dava água na boca de um menino de tempos mais sóbrios, quando as marcas de bons produtos eram poucas, mas inesquecíveis.

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