sexta-feira, 2 de outubro de 2009

A cidade vazia

De outra feita, tomei emprestado para um artigo um título de Rubem Braga, Apareceu um Canário.

Desta vez, nova liberdade, dou uma surrupiada em Fernando Sabino, tomando-lhe momentaneamente o título de seu livro, de crônicas sobre Nova Iorque.

Mas não é de Nova Iorque que quero falar; é de São Paulo de ressaca, após o tumulto todo do Ano Novo. É chocante, uma surpresa o contraste.

Na véspera, os rojões silvavam e explodiam sobre nossa tranquila ceia, embora minha rua continuasse deserta. Seria a nova família que mudou recentemente para nossa frente, dando sangue novo e animação a uma ruazinha composta quase só de vizinhos já idosos, amargos e aposentados? 

Olhei para o escuro e o silêncio lá fora; não, não eram eles. Creio que os novos e luxuosos prédios em volta, extravasando sua euforia de alto faturamento, juros e dividendos mesmo num ano terminando em crise e agonia, para não falar de desespero, no Oriente Médio.

Saio pela manhã, esperançoso ao portão, aproveitando minha nova onda de boa vontade. Conseguiria desejar um bom ano a alguém? Nada, todo mundo parece dormir, apesar de a farra não ter sido tanta, acho.

Meu filho acede em levar-nos ao Parque do Butantã, deslizando pela Marginal do Pinheiros deserta. Mas, também lá os portões estão fechados; dormem as jibóias e cascavéis, dormem os macacos em suas jaulas.

Vamos então à Cidade Universitária, onde conseguimos entrar graças à sua carteirinha da USP. Estacionamos e saímos a caminhar pelos bosques e caminhos desertos. Não há vivalma, como se diria antigamente. É exagero: uma ou outra pessoa aparece, um carro passa, mas a sensação de vazio permanece.

Que quer dizer esta pausa, será a calmaria que antecede a tempestade?

Dizem que, nas tsunamis, a primeira coisa que acontece é o recuar da água, deixando vasta extensão a descoberto. Mas isto é só o prenúncio da onda gigante se formando, e logo ela desaba com toda a sua fúria.

O Ano Novo... parece haver uma hesitação, enquanto ele toma forma. Todo mundo aguarda, mudo e apreensivo, pois ninguém sabe o que nos trará.

Um ano surpreendente, com uma crise nunca vista desde o crack da Bolsa em 29; um dos países mais racistas e radicais do mundo com um novo presidente, e negro. O Oriente Médio novamente em chamas, e não é dos poços de petróleo. A poluição e o aquecimento global atingindo níveis alarmantes. 

Que será de ti, mundo, em 2009? Talvez por isto essa estupefação, esse grande silêncio pelas ruas e avenidas. Novamente, o planeta está sendo medido, pesado e julgado, e tememos esse juízo, que não será o Final, mas parcial, com esperanças ainda de recursos e apelações.

Que ele possa se recuperar, que as esperanças possam voltar a todos corações; que a vida, mais conscientizada, siga em frente, imbatível e implacável como vem sendo, desde que o mundo é mundo.

E vâmo que vâmo!

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