sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Com Flash Gordon trancado na mala

Talvez alguns de vocês, na infância amantes de histórias em quadrinhos, tenham conhecido o herói Flash Gordon, que saía no Suplemento Juvenil, no final dos anos 30.
Existiram outras versões mais tarde, e até um filme, super produzido,
há algum tempo, com Ornella Muti e Max Von Sidow. Mas na citada época o herói atingia seu apogeu, uma fase áurea no pincel do americano Alex Raymond.

Eu também não sou desse período. Nasci depois, e conheci os magníficos desenhos de Alex na infância, quando ele desenhava Rip Kirby, um detetive que recebeu aqui o nome de Nick Holmes.
Sempre me impressionaram muito, mas só muitos anos depois, quando desenhava para a Editora Outubro, na Mooca, próxima à Rua Luis Gama, é que tive conhecimento da monumental obra do artista naquela fase barroca de Flash Gordon.

Foi uma revelação, e um choque. O vigor e a elegância dos traços era sem par, ainda mais para aquele tempo. Teve muita influência em meu estilo. O mundo dá muitas voltas, e nalgumas delas ficamos, até hoje, sem saber bem como a coisa aconteceu.

Mas o fato é que, no início de 62, eu embarquei para Porto Alegre, com um original do Flash Gordon desenhado por Alex na minha mala.
E valendo algumas dezenas de milhares de dólares, ainda mais que o autor já era falecido. Esta página, de grosso cartão e grandes dimensões, tinha sido enviada pelo autor para a primeira exposição de quadrinhos feita no Brasil, em 1951. Pela qual foram responsáveis Álvaro de Moya, Jayme Cortez e Miguel Penteado, e aconteceu no Bom Retiro.

Foi talvez por ter participado do movimento pela nacionalização dos quadrinhos, liderado aqui em São Paulo por Maurício de Souza, que eu tenha tido esse privilégio e a nossa sala, a 1922 do prédio Martinelli ter sido a sede, por falta de outro lugar, para o fracassado movimento.
Creio que nossos patrões, Cortez e Penteado, da Outubro, emprestaram-nos o original como estímulo à associação a ser fundada.
Passada esta fase, o polo de nacionalização, e a esperança do desenhista nacional, passou a ser a cooperativa de Porto Alegre, fundada por Brizola, e dirigida por um desenhista carioca - digamos que se chamasse Geraldo.

Então o bravo Flash Gordon partiu comigo, em mais uma heróica missão de boa vontade, para um outro planeta: a para mim desconhecida capital gaúcha.

Era uma página do episódio do Reino das Florestas de 1937. Obviamente, fez muito sucesso entre os admiradores gaúchos, mas não para o presidente da cooperativa. Mau desenhista e complexado, limitou-se a um muxôxo de despeito: Alex Raymond?... Ah, eu o conheci em Nova Iorque. Era um baixinho...

Como se Raymond, um gigante do desenho, pudesse ser mensurado em centímetros.
E seu crítico, o carioca, também não era nada alto, apesar de muito forte. Mas, no desenho, era um nanico.
A cooperativa fracassou, diante de tanta mesquinhez e politicagem. Mas, antes disto, eu já estava a salvo. Tinha conseguido meu primeiro cargo importante na propaganda aqui em São Paulo, então Flash Gordon fez mais um viagem espacial, dentro da mala.

E retornou a seus antigos donos. Hoje faz parte do acervo de Álvaro de Moya, que possui ainda originais do Príncipe Valente, Rip Kirby, Tarzan e outras preciosidades, e escreveu um belo livro: “Anos 50, 50 Anos”, contando como elas vieram parar em São Paulo.

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