sexta-feira, 2 de outubro de 2009

O feitiço da Vila

Vila Buarque, como o Chico... que aliás começou sua carreira nos barzinhos dali, redutos de estudantes da Maria Antonia, como o “Sem Nome”.

A Vila Buarque teve seus dias de fascínio também para mim, desde que entrei para a MPM, em 75. Ela dava seus primeiros passos como grande agência de publicidade paulista - pois já era grande no Sul-, ali num modesto prédio da R. General Jardim. 
Eu trabalhava em estado de graça. A nossa pequena equipe realizava grandes e prestigiosas campanhas quase sem se dar conta disso, tão fácil e naturalmente decorriam os trabalhos.

Sempre brincando e fazendo zombarias mútuas, somente vim a me inteirar da importância do que havíamos feito em 77, tal o número de prêmios no Anuário de Criação, Festival de Veneza e Prêmio Colunistas.

Mas aí já era tarde, eu e outros membros da Criação já havíamos mudado de agência.
Mas foi bom enquanto durou... nosso prédio dava vistas para trás, na Major Sertório, ao famoso La Licorne, do outro lado da rua. Na calçada de cá, em frente, outra “boate menor”, o Big Ben. Junto a este, uma casa de cômodos onde os travestis estendiam suas perucas nas janelas, para secar. E ficavam por ali, os bustos nus, peludos, mas com seios! Minha sala dava para este lado, enquanto o estúdio mirava a Gen. Jardim. Era pitoresco, e com algum perigo. Mas era pouco: quando saímos às vezes mais tarde, na noite, para chegar à garagem, na Major Sertório, tínhamos de passar por um bando de travecos. Ficavam diante do Bradesco da esquina, altos, fortes e com perucas loiras. Com suas mini–saias, botas e blusas de couro preto, lembravam uma cena de “Cabaret”, ou andróginos astros de heavy metal.

Nossos almoços eram quase sempre festivos, graças à boa disposição de meu redator, Sylvio, a “Velha Serpente”. Era nosso mentor, e então íamos ao Roperto e ao Capuano, no Bexiga. Ou, ali mais perto, ao Kakuk e ao Giardino di Napoli.

Mas, muitas vezes, só subíamos a Gen. Jardim. Ali, na esquina com Martim Francisco, havia uma simpática lanchonete, que chamávamos de “Cadeirinhas na Calçada”.
O nome já a descreve, e quem chegava era só puxar uma cadeira, armar e logo seria atendido pela enérgica dona do lugar, com seus pratos árabes, esfihas, beirutes e sanduíches. 

Alguns de meus colegas, como “A Serpente”, não dispensavam um aperitivo, como a afamada pinga de Morretes. Depois ele se escondia em baixo de sua mesa, deitado numa taboa a que chamava “o catre”, e chegava a roncar.
Certa vez, o poderoso Patrão estava fazendo sua famosa rota de inspeção pelas salas, e perguntou - o Sylvio ainda não voltou? Embaixo da mesa, este se encolhia, mais ainda, como uma serpente.

Quando dava, eu percorria a pé as ruas da região, observando a antiga chácara de Dona Veridiana, hoje Clube São Paulo, só para homens. A Santa Casa, o Mackenzie, a Av. Higienópolis, as várias livrarias do pedaço.

Como disse, saí de lá por melhores salários. Mas esta época ficou gravada como a melhor de minha carreira, e podem imaginar minha alegria, dez anos depois, quando fui convidado a voltar. Mas o passado não se repete, por mais que queiramos. 
As coisas já não eram as mesmas na agência, e seus melhores dias já se haviam transcorrido.

Estava lá já há cinco anos, e quando pensava que agora sim, tudo ia melhorar, veio a notícia:
A agência, que não estava indo bem, tinha-se fundido com a Lintas, 
a agência da Lever. Isto de “fusão” é só um termo paliativo; tinha sido mesmo é vendida.

E agora, em situação precária e incerta, mudaríamos para um palácio de vidro, noutra vila, a Olímpia. Não ia dar certo... e não deu, mesmo!
Mas, isto fica para outra vez.

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