sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Cão também é ser humano

Não sei quantas vezes já usei esta frase, atribuída ao ex-ministro Magri. Pode ser mesmo usada para quase tudo, de ratos e homens.
Mas, neste caso, é cão mesmo: a nossa Laika.
Toda manhã vem nos saudar, da porta da cozinha, sorrindo. 
Não é mentira: até algum tempo atrás, ela abria um esgar de hiena, com os dentes arreganhados de alegria. Mas, já não vejo tal risada, só um discreto sorriso.
Está bem velhinha, coitada: no calendário canino, seus treze anos correspondem a uns noventa dos humanos.
Com as cãs brancas - epa, assim já é demais, afinal é mesmo um cão, 
e branca sempre foi, de nascença - é ainda toda energia, e movimento.
Soube recentemente que quanto maior o cão, mais rapidamente fica velho e morre. Mas ninguém avisou Laika disto, nem ela parece dar a menor bola para tal parecer. E é grande, sem ser enorme. Sempre esbelta e musculosa, não deixa por menos: sempre alerta, como o lema dos escoteiros, ao mínimo ruído suspeito salta e late, com fúria. Mestiça de dobermann e dálmata, sempre foi um Dr. Jekill/Mr. Hide: para nós é dálmata, com carinho e fidelidade. E dobermann, furioso, para todo o mundo fora dos portões.
Sempre foi assim. Desde pequenina, doada que fora por uma amiga 
de minha filha, já demonstrava pouca tolerância para com estranhos.
Quando, de certa feita, um cunhado veio nos visitar com a filhinha, quisemos mostrar a jovem aquisição. Não teve negociação: ela rugiu 
e latiu o tempo todo, não se deixando tocar.
- É brava mesmo – concluí. E assim passaram-se os anos. Meus filhos 
de adolescentes passaram a adultos, e Laika continua a mesma.
Algumas vezes levei-a para passear pelo Brooklin, como fizera com nossos cães anteriores.
Nosso bairro, com suas belas ruas, planas, retas e arborizadas, 
principalmente nas imediações da Paróquia de São João de Brito e da Hípica Paulista, é perfeito para tais passeios.
E logo desisti: primeiro, ela implicava com todos os cães que via; depois com motos e ciclistas. Finalmente, começou a latir para os vizinhos em seus jardins, e assim não dá, mesmo.
Nascera para guardiã da casa, então aqui é o seu lugar.
Forte e gulosa, come tudo que lhe dão, de ração a legumes e frutas.
Talvez aí a razão de tanta animação e energia. Não está mais tão perfeita; ás vezes, num movimento brusco, tropeça e claudica. 
É a artrite, e num canto de um olho começa a despontar o véu de uma catarata.
Apenas mais um cão, entre tantos que habitam esta cidade.
Mas, como todos eles, notável e ímpar nas suas qualidades 
e defeitos.
Nobre Laika, mesmo sem raça definida.
Não sabemos quanto tempo mais ficará entre nós, mas sua marca perdurará enquanto bater nosso coração.

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