São Paulo sempre foi pródiga em pernilongos. Fruto de suas extensas várzeas, muito abundantes naqueles 1955, quando vim para cá. Resultado de seus muitos córregos, riachos, regatos; ou, como preferiria um gaúcho, arroios.
Muitos foram canalizados, mas volta e meia extravazam, e água é o que aqui não falta, geralmente. No verão, então, é melhor nem falar nisso.
Mas tudo muda, tem seus ciclos, e os pernilongos não são exceção.
Em 55, eram muitos e atacavam sempre à noite. Vulgares Anopheles, creio. O jeito era acender umas espirais que soltavam fumaça, próximo ao rosto, e embrulhar o corpo em lençóis, mesmo fazendo calor.
Não sei se tais espirais ainda existem - ou funcionam -, mas creio que sim. Existiram períodos de muito pernilongo, chusmas invadindo as casas logo ao cair da tarde, como o piano da Eldorado.
Às vezes mais mesmo que em nossa casa de praia, na selvagem Barra do Sahy, onde o uso de repelentes era obrigatório. Citronella de dia, contra os borrachudos, e cremes à noite, contra os grandes, lentos e negros pernilongos. Para dormir, somente com mosquiteiro, pois, mesmo tudo estando fechado, entravam por qualquer fresta.
Aqui no Brooklin, teve fases de voarem descaradamente pela sala iluminada, à noite, para atacar traiçoeiramente no escuro dos quartos. E, ao contrário do difundido, ventiladores não adiantam, nem os desviam de seus alvos. O jeito foi apelar para os velhos e bons mosquiteiros de praia.
Em outros períodos, não. Não sei se por cuidados finalmente tomados pela prefeitura, ou ciclos naturais, eles desaparecem.
É a fase atual: os monstros da noite desapareceram, ou quase, para serem substituídos por algo muito pior, seus pequenos primos diurnos.
Estes, quase invisíveis, de vôo muito diferente, rápido, errático, costumam atacar com golpes baixos: pés, calcanhares e pernas são seus preferidos. E a picada é muito mais tinhosa que a dos grandões, cujo ardor passava rapidamente. Estas às vezes incham e coçam por dias.
E o Aedes Aegypti, perguntarão vocês? É disso que estamos falando? A princípio, achei que sim, mas examinados com lente, mostraram-se marrons e sem pintas. Até um dia que, no jardim, munido de um puçá, como um êmulo de Wallace e Bates, famosos naturalistas ingleses que aqui estiveram, apanhei um no ar, e não haviam dúvidas: negro, todo pintalgado de branco, como fantasiado de petit-pois. Era ele, o Aedes em pessoa.
Apanhamos vários outros, desde então. Transmissor, na melhor das hipóteses, da dengue e da febre amarela, em já vastas regiões do país, eles estão aqui, mesmo em bairros limpos e residenciais. Já estiveram em casas fiscais da prefeitura, vistoriando a região. Nada adiantou. Não deveria ser tão difícil assim, já que o monstrinho tem raio de ação de apenas cem metros a partir de seu criadouro.
Mas, existem piscinas mal cuidadas, casas sem moradores, talvez caixas d’água descobertas... Então, nós que nos cubramos. É usar repelente, ou teremos de ficar na sala, ou no jardim, de capacetes, roupas fechadas, meias grossas, calçados, e claro, puçás para caça em pleno verão.
Como se estivéssemos na selva amazônica, com Wallace e Bates.
Há 8 anos
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